PARA FHC, O BRASIL PRECISA ADOTAR ESTRATÉGIA DE LONGO PRAZO PARA SE ADEQUAR À NOVA REALIDADE MUNDIAL

Ex-presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, analisa cenário político mundial, em encontro na Fiesp

Em reunião inaugural do Conselho Superior de Estudos da Política (Consep), nesta sexta-feira (30/8), o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso (1995-2003), sociólogo, cientista político, professor universitário e autor de diversos livros, reuniu-se com lideranças empresariais e conselheiros da Fiesp a fim de avaliar o atual cenário político mundial.

A política internacional necessita de visão de longo prazo, apesar das decisões necessárias a serem tomadas no dia a dia, pois se trata de um processo em evolução, refletiu o ex-presidente no início de sua exposição. Ele exemplificou a aproximação que se deu entre China e Estados Unidos, no mandato de Henry Kissinger [que publicou On China, que trata da aproximação dos dois países nos anos 70] que resultou em um comércio internacional benéfico, inclusive porque o país oriental comprava títulos norte-americanos. Mas há o contraponto, pois, quando a China começa a se tornar potência, os Estados decretam o America first, “uma volta ao passado”, na avaliação do cientista político. Mas, se essa integração foi possível após um período de certa reserva, a Europa não conseguiu, por exemplo, aceitar a Rússia como parte integrante do seu continente, que acabou se aproximando da China com quem faz fronteira, “mas essa situação começou a mudar”, na análise de FHC, que debateu com os presentes a instabilidade da União Europeia, com a saída do Reino Unido, o Brexit, e questões relativas à moeda adotada, o euro.

A América Latina, nesse cenário, fica à margem desses outros grandes conflitos mundiais, mas, por outro lado, apesar de o Mercosul fluir com certa liberalidade, não ocorreu ainda uma integração verdadeira. A reflexão que se faz necessária é que foi desenhado um novo mundo, com o advento e o encerramento da Segunda Guerra Mundial, cuja reordenação deu impulso à globalização. Mas esse panorama anterior começou a ser substituído por ideias, configurando novas relações entre os países, suas culturas próprias, além da sociedade, que gera impactos nos âmbitos econômico e político e ocorre uma fragmentação, segundo explicou FHC.

Especificamente em relação ao Brasil, o ex-presidente frisou que precisamos adotar estratégia de longo prazo a fim de adequar o país a essa nova realidade que surge a nível mundial e é preciso capacidade de pensar como ele será e não mais como era. “Estamos longe dos espaços de conflito, o que nos dá espaço para agir”, recomendou, e por isto mesmo é “fundamental determinar nossos interesses em período de instabilidade. Precisamos acertar o rumo” e aumentar a coesão, refletiu.

A tecnologia está na gênese dessas mudanças ocorridas em curto espaço de tempo, alterando também as formas de produção e as relações pessoais: “a tecnologia pôs em crise todas as democracias representativas”, avaliou, “a sociedade contemporânea muda sua forma de organização e criam-se ‘tribos’ que afetam as estruturas com o impacto promovido pela internet. “Ninguém sabe o que vai dar. Em história, nada é garantido, tudo se constrói”, afirmou. Em sua avaliação, a inovação tem estreita relação com a educação e o professor precisa ser prestigiado, especialmente os da Educação Básica: “O mundo será tecnológico com todas as suas consequências”, alertou.

Em relação à empregabilidade, Fernando Henrique frisou a preocupação com as camadas da população que serão ‘inimpregáveis’ em função da evolução tecnológica, um problema a ser avaliado. Se por um lado promove a competitividade, de outro, há concentração de renda a alertar para a desigualdade social existente.

Quanto ao Mercosul, FHC frisou o prestígio anterior que o Brasil possuía e enfatizou que a eficácia nasce da autoridade: “Não se pode olhar para o país de modo abstrato, mas ter em vista a configuração do mundo. Perdemos um pouco da influência junto ao mundo e em relação à América Latina.

Ao se pronunciar como um admirador do modelo das universidades nos EUA, FHC disse que nelas predomina a autoconfiança e o modo como lidam com os governos e as empresas, sem obstáculos, de modo diverso do que ocorre no Brasil. “O caminho é privilegiar a ciência, a tecnologia, falar e ser ouvido e ter representatividade. Não podemos mais perder tempo na batalha no campo científico e tecnológico”, concluiu.

Também integraram esse encontro os representantes dos Conselhos Superiores de Assuntos Jurídicos e Legislativos (Conjur), de Estudos Avançados (Consea) e do Comércio Exterior (Coscex).

Fonte: FIESP


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