Regras mais claras para o trabalhador temporário

E m 14 de outubro de 2019, o presidente da República, Jair Bolsonaro, assinou o Decreto Nº 10.060/19, que regulamenta o trabalho temporário presente na Lei Nº 6.019/74.

Em um país que precisa restabelecer um ciclo virtuoso de crescimento econômico, a novidade é positiva, porque elucida e simplifica aspectos importantes das relações de trabalho entre contratante e trabalhador temporário – e, como sabemos, a complexidade da legislação trabalhista é um dos nossos pontos fracos quando se trata de competitividade internacional. O referido decreto deixa claro que regulamenta apenas o trabalho temporário, e não a prestação de serviços, inserida pela Lei Nº 13.429/17. Esta, quando foi editada, “mesclou” trabalho temporário e terceirização, o que acarretou certa confusão legal. Esclareça-se que a Lei Nº 13.429/17 regulamenta o trabalho temporário e a terceirização (prestação de serviços, que o Decreto Nº 10.060/19 faz questão de deixar claro não ter sido objeto de sua regulamentação). Atualmente, vigoram duas leis tratando da terceirização: a Lei Nº 13.429/17, que também trata de trabalho temporário; e a Lei Nº 13.467/17, chamada de “Reforma Trabalhista”. Agora, além destas leis, temos um decreto regulando o trabalho temporário: o de Nº 10.060/19, de que trataremos neste artigo. TRABALHO TEMPORÁRIO VERSUS TRABALHO INTERMITENTE O decreto recém-assinado traz a identificação precisa da natureza jurídica do trabalho temporário, no seu artigo 3º, que assim dispõe: Regras mais claras para o trabalhador temporário Decreto presidencial simplifica regras relacionadas ao trabalho temporário, conferindo maior segurança jurídica às partes envolvidas Para fins do disposto neste Decreto, considera-se: IV - Demanda complementar de serviços - demanda oriunda de fatores imprevisíveis ou, quando decorrente de fatores previsíveis, que tenha natureza intermitente, periódica ou sazonal. Ainda que o Decreto Nº 10.060/19 mencione, no artigo 3º, inciso IV, que “demanda complementar de serviços - demanda oriunda de fatores imprevisíveis ou, quando decorrente de fatores previsíveis, que tenha natureza intermitente, periódica ou sazonal”, não se pode concluir que é possível a utilização de trabalhador intermitente, prevista na Lei Nº 13.467/17 (artigo 443, §3º), como se fosse temporário. São leis e situações de trabalho diferentes, com naturezas jurídicas próprias. Tanto é assim que o trabalhador intermitente é regulado por uma lei e o temporário por outra. REGISTRO DA EMPRESA DE TRABALHO TEMPORÁRIO Com a extinção do Ministério do Trabalho, o registro das empresas de trabalho temporário será feito junto ao Ministério da Economia. O Estado ainda mantém o controle sobre o registro das empresas de trabalho temporário no que tange à sua organização e funcionamento. Também foi mantida a fiscalização dos Auditores Fiscais do Trabalho. CAPITAL SOCIAL O artigo 5º do Decreto Nº 10.060/19 dispõe sobre o capital social mínimo para constituição e funcionamento das empresas de trabalho temporário. A Lei Nº 13.429/17, exigia que as empresas de trabalho temporário tivessem um capital de pelo menos 100 mil reais José Eduardo Pastore* 18 REVISTA TRANSPARÊNCIA DEZEMBRO 2019 ARTIGO para a constituição e funcionamento deste tipo de empresa. Este critério econômico de constituição de empresas de trabalho temporário funcionava como uma “régua mínima”, que obrigava, pela via econômica, o nascimento de empresas com maior capacidade econômica para suportarem os elevados custos do trabalho temporário – operação e funcionamento: Art. 5º. Observadas as normas complementares editadas pelo Ministério da Economia, o pedido de registro da empresa de trabalho temporário no referido Ministério será instruído com os seguintes documentos: I - prova de constituição da pessoa jurídica e registro na Junta Comercial da localidade em que a empresa tenha sede; II - prova de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica; e III - capital social compatível com o quantitativo de empregados, observados os seguintes parâmetros: a) empresas com até dez empregados - capital mínimo de R$ 10.000,00 (dez mil reais); b) empresas com mais de dez e com até vinte empregados - capital mínimo de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais); c) empresas com mais de vinte e com até cinquenta empregados - capital mínimo de R$ 45.000,00 (quarenta e cinco mil reais); d) empresas com mais de cinquenta e com até cem empregados - capital mínimo de R$ 100.000,00 (cem mil reais); e e) empresas com mais de cem empregados - capital mínimo de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais). FISCALIZAÇÃO TRABALHISTA As empresas de trabalho temporário, ainda que estejam vinculadas ao Ministério da Economia, são fiscalizadas pelos Fiscais do Trabalho. As normas de proteção ao trabalhador permanecem intocadas pelo Decreto Nº 10.060/19, como não poderia deixar de ser: Art. 10. A empresa de trabalho temporário fica obrigada a apresentar ao agente da fiscalização, quando solicitado, o contrato celebrado com o trabalhador temporário, a comprovação do recolhimento das contribuições previdenciárias e os demais documentos comprobatórios do cumprimento das obrigações estabelecidas neste Decreto. (...) Art. 14. A empresa tomadora de serviços ou cliente manterá, no seu estabelecimento, e apresentará ao agente da fiscalização, quando solicitado, o contrato de prestação de serviços de colocação à disposição de trabalhadores temporários celebrado com a empresa de trabalho temporário. Art. 15. É responsabilidade da empresa tomadora de serviços ou cliente garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores quando o trabalho for realizado em suas dependências ou em local por ela designado. AMPLIAÇÃO DAS PROTEÇÕES DOS DIREITOS De acordo com o Decreto Nº 10.060/19, ao trabalhador temporário estão assegurados direitos como: remuneração equivalente àquela recebida pelos empregados da mesma categoria da empresa tomadora de serviços ou cliente; pagamento de férias proporcionais; recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS); Foto: divulgação DEZEMBRO 2019 REVISTA TRANSPARÊNCIA 19 benefícios e serviços da Previdência Social e seguro de acidente do trabalho: Art. 20. Ao trabalhador temporário são assegurados os seguintes direitos: I - remuneração equivalente àquela percebida pelos empregados da mesma categoria da empresa tomadora de serviços ou cliente, calculada à base horária, garantido, em qualquer hipótese, o salário-mínimo regional; II - pagamento de férias proporcionais, calculado na base de 1/12 do último salário percebido, por mês trabalhado, nas seguintes hipóteses: a) dispensa sem justa causa, b) pedido de demissão; ou c) término normal do contrato individual de trabalho temporário. III - Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, na forma prevista em lei; IV - benefícios e serviços da Previdência Social; V - seguro de acidente do trabalho; e VI - anotação da sua condição de trabalhador temporário em sua Carteira de Trabalho e Previdência Social, em anotações gerais, conforme regulamentado em ato do Ministro de Estado da Economia. (...) Art. 21. A jornada de trabalho para os trabalhadores temporários será de, no máximo, oito horas diárias. (...) Art. 22. Será assegurado ao trabalhador temporário o acréscimo de, no mínimo, vinte por cento de sua remuneração quando trabalhar no período noturno. Art. 23. Será assegurado ao trabalhador temporário o descanso semanal remunerado nos termos do disposto na Lei nº 605, de 5 de janeiro de 1949. TRABALHO DIGNO O trabalhador temporário tem o direito de utilizar as instalações médicas do contratante de seu trabalho, bem como refeitório dos trabalhadores efetivos. Art. 16. A empresa tomadora de serviços ou cliente estenderá ao trabalhador temporário colocado à sua disposição o mesmo atendimento médico, ambulatorial e de refeição destinado aos seus empregados existente nas suas dependências ou no local por ela designado. SUBORDINAÇÃO A negativa de vínculo de emprego expressa em lei não é uma prática comum no ordenamento jurídico trabalhista. A dialética da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é no sentido de apontar o que vem a ser determinada figura jurídica. A estrutura lógica e de comunicação da CLT é de construção de uma narrativa legal positiva. As exceções são quando a CLT descreve o que não caracteriza determinado fato jurídico, como fez o Decreto No 10.060/19, no seu artigo 17: Art. 17. Independentemente do ramo da empresa tomadora de serviços ou cliente, não existe vínculo empregatício entre esta e os trabalhadores contratados pelas empresas de trabalho temporário. Já o artigo 18 autoriza claramente que o trabalhador temporário seja subordinado ao contratante de seus serviços: Art. 18. A empresa tomadora de serviços ou cliente exercerá o poder técnico, disciplinar e diretivo sobre os trabalhadores temporários colocados à sua disposição. CONCLUSÃO As regras estão mais transparentes para o contratante de trabalhador temporário – que, por sua vez, tem mais clareza acerca dos benefícios e direitos aos quais faz jus. Essa configuração só pode ser boa para o País, uma vez que reduz um importante foco de tensão nas relações trabalhistas, aumentando a segurança jurídica para todas as partes envolvidas.

Fonte – REVISTA TRANSPARÊNCIA


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